Quando o que você busca também é o que você mostra: como escolher um relacionamento saudável e coerente com suas atitudes

 

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Muitas mulheres anseiam por relacionamentos saudáveis, respeitosos e recíprocos e não há nada de errado nisso. O que é necessário, porém, é observar se aquilo que buscamos externamente está sendo refletido em nossas atitudes internas e comportamentos. Em uma abordagem gestáltica, não há separação rígida entre sujeito e ambiente: o modo como nos relacionamos com o mundo, conosco e com o outro é uma totalidade integrada. Neste artigo, exploraremos a importância de saber escolher conscientemente o tipo de relacionamento, os pilares de um vínculo saudável e como alinhar o que você busca com o que você demonstra, tudo sob a lente de uma psicóloga com fundamentação em Gestalt-terapia.

1. A importância de escolher conscientemente o tipo de relacionamento


1.1 Relações não “pré-feitas”

Não existe um modelo único de relacionamento ideal (monogamia rígida, namoro aberto, etc.) que funcione para todas. O que importa é que o tipo escolhido seja coerente com seus valores, suas necessidades emocionais e sua forma de entrar em contato afetivo.

1.2 Evitando a dissonância entre desejo e prática

Muitas vezes se deseja um relacionamento respeitoso, mas age-se de forma inconsciente com inseguranças, cobrança excessiva ou padrões autorreferentes que sabotam essa possibilidade. Se você exige reciprocidade, mas não oferece espaço para o outro existir, cria-se uma dissonância relacional.

1.3 Responsabilidade afetiva

Ao escolher uma relação, você está assumindo um pacto implícito de interação com outra pessoa. Isso envolve responsabilidade por suas próprias emoções, clareza de limites, comunicação honesta e disposição para lidar com conflitos com autenticidade, não com idealizações.

2. O que caracteriza um relacionamento saudável e respeitoso


A partir da teoria relacional e da Gestalt-terapia, podemos identificar alguns pilares que sustentam um vínculo saudável:

PilarDescrição / Exemplos
Contato autêntico e
diálogo
Relações saudáveis permitem expressão aberta, escuta verdadeira e conexão no “aqui e agora”. Na Gestalt, o “contato” é central: como cada um toca o outro com presença. 
Autonomia
e interdependência equilibradas

Nem fusão nem isolamento: cada pessoa mantém seu sujeito, sua identidade, mas pode se conectar com o outro. Relacionamentos saudáveis respeitam a diferença e a alteridade. 
Consciência (Awareness)
Estar atento aos próprios sentimentos, aos gestos corporais e ao modo como você reage no relacionamento. Aumentar essa consciência reduz ações impulsivas e reativas. 
Capacidade de abertura ao conflito
Conflitos são inevitáveis. O que define uma relação saudável não é a ausência de desentendimentos, mas saber expressá-los com respeito e buscar solução conjunta.
Sustentação no campo relacional
Em Gestalt, o relacionamento é visto como um campo dinâmico (emergente), onde as polaridades (proximidade/distância, atração/avesso, ritual/conflito) são trabalhadas com atenção e criatividade.

Quando esses pilares estão presentes, o relacionamento se torna um ambiente de crescimento mútuo, não de limitação emocional.

3. Como alinharmos o que buscamos com o que mostramos


3.1 Auto-reflexão constante

Pergunte-se: “Se eu fosse entrar nesse relacionamento, quais seriam minhas condições não negociáveis?” “Como me comporto hoje em relacionamentos: demonstro autoamor, respeito e limites claros?”

3.2 Coerência entre intenção e gesto

Desejar respeito não basta: é necessário agir de modo respeitoso. Isso implica não tolerar abusos, saber dizer “não”, expor suas necessidades e também reconhecer quando você está sendo difícil de lidar.

3.3 Exercícios corporais e awareness

Na abordagem gestáltica, o corpo revela o que a mente ainda não admite. Preste atenção às sensações corporais quando pensa no outro: tensão no peito, garganta, ombros, peso nos pés esses sinais indicam emoções que pedem atenção.

3.4 Feedbacks e espelhamentos

Em uma relação consciente, é saudável pedir ao outro que espelhe sua postura (ex: “quando você fez isso, eu me senti”) e também oferecer esse espelho sem julgamento.

3.5 Revisão periódica do pacto relacional

Relacionamentos evoluem as pessoas mudam. Portanto, revisar conjuntamente o tipo de vínculo, acordos, necessidades e limites é parte de manter saúde relacional.


4. Desafios comuns e como enfrentá-los

  • Idealização do parceiro: imaginar que o outro é perfeito impede de enxergar limitações reais e negociar conjuntamente.

  • Medo do abandono: pode levar à cobrança ou controle exagerado. Trabalhar autoestima e segurança interna é fundamental.

  • Fusão emocional: perder-se no outro, abrindo mão de suas fronteiras.

  • Padrões parentais internalizados: repetir modelos aprendidos (pais disfuncionais, amores idealizados) sem perceber.

  • Culpa e autoacusação: assumir culpa o tempo todo fragiliza a comunicação e gera ressentimento.

Cada um desses desafios pode ser trazido ao campo da terapia sob o enfoque gestáltico, com foco no presente e no processo de contato, não na culpa ou diagnóstico.


5. A visão da Gestalt-terapia nos relacionamentos


A Gestalt-terapia aborda a relação como uma construção vivida no presente, entre o self e o outro, num campo em constante mutação. Ela privilegia:

  • O aqui e agora: o que está emergindo entre vocês no momento da relação é mais importante que histórias passadas ou rótulos.

  • Fenomenologia e diálogo: investigar a experiência vivida sem imposições interpretativas.

  • Atitude experimental: testar novas formas de contato, expressão e limites no relacionamento. 

  • Campo relacional: a relação tem uma “terra” própria nem “eu” nem “você”, mas o “nós-em-viagem”. 

Em terapia de casal sob abordagem gestáltica, o terapeuta fica atento não apenas aos conteúdos dos conflitos, mas ao modo como cada um entra em contato com o outro, ao que é trazido ao espaço relacional e ao que é evitado.

6. Casos Ilustrativos:

Maria desejava um relacionamento com reciprocidade, mas em suas atitudes ela ficava ansiosa, cobrava o parceiro com mensagens, revisava redes sociais mostrando insegurança e desconfiança.
Nesse caso, o trabalho terapêutico (sob abordagem gestáltica) poderia ajudar Maria a perceber essas estratégias como manifestações de sua própria ansiedade, trazê-las ao campo do relacionamento (dialogar com o parceiro sobre seus medos) e propor experimentos de contato (ex: ficar um tempo sem checar telefone, expressar insegurança verbalmente no momento de tensão) para verificar se a reciprocidade se mantém.

Joana sempre entrava em relações “fortes e intensas”, com fusão emocional e pouco espaço para ambos manterem sua individualidade.
O trabalho seria facilitar que Joana experiencie, no espaço terapêutico, o peso da fusão, reconhecer padrões parentais internalizados e experimentar novas formas de contato com separação, ou seja, possibilitar que ela entre em relações mantendo sua figura.

Você pode inserir pequenos relatos ou casos clínicos (respeitando anonimato) para tornar o texto mais próximo e prático.

Desse ponto de vista, buscar um relacionamento saudável e respeitoso não é algo errado é legítimo e necessário. O essencial é que haja coerência entre o que você deseja e o que você emite com suas atitudes. Quando você caminha com consciência, presença e autenticidade, atrai relações que ressoam com essa integridade.

Relacionamento é terreno de crescimento: quem se relaciona bem, aprende sobre si, sobre o outro e sobre o mistério de se conectar sem perder-se.

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